Por Andre Marsiglia
Quando uma manifestação começa a ficar descontrolada, uma das medidas policiais é jogar bomba de gás lacrimogêneo na multidão, dispersando seu núcleo ativo para todos os lados, impedindo que volte a se reunir. Depois da dispersão, além do medo causado, ninguém sabe bem para onde retornar, a quem seguir. Amansa-se o povo, bovina-se a manifestação.
Claro, isso também acaba sendo usado para conter manifestações legítimas, indigestas a autoridades e governantes. Nestes casos, as bombas são lançadas para proteger interesses dos poderosos.
O que fez o Supremo Tribunal Federal (STF) foi jogar uma bomba de gás na multidão que estava reunida na praça pública que se tornou o Twitter/X. Afinal, sabemos que a plataforma concentrava os críticos do STF, fazia circular as mensagens da chamada “Vaza Toga”, iniciada pelo jornal Folha de S.Paulo, mobilizava as pessoas para manifestações, cobrava o impeachment de ministros, expunha as mazelas judiciais deste país e, talvez, conseguisse que as eleições municipais não guindassem ao poder os mesmos candidatos de sempre.
A bomba do STF, disparada na praça pública do Twitter/X, dispersou a multidão. Uns seguem perdidos respirando fumaça, outros foram para o Instagram, outros para o Threads, outros para o Blesky, outros estão com medo e foram embora. Eu, por ter alguma visibilidade e notoriedade, não posso voltar ao foco da fumaça sem que o STF me atire uma bala de borracha de R$ 50 mil no meio da testa. E, mesmo que eu volte, sei que meu público já foi dispersado. O estrago está feito.
STF e fala de Barroso sobre inquéritos
No meio deste caos, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo, anunciou que os inquéritos sigilosos do STF estão próximos do fim. Não acredite nisso, leitor. Trata-se apenas de um pirulito para agradar as crianças que se assustaram com o gás e precisam ser acalmadas. São muitos os inquéritos. Encerrarão um ou outro e não nos darão acesso ao conteúdo de nenhum deles, alegando que se conectam aos que seguem ativos e sob sigilo.
A indagação que fica, depois do episódio, é: a multidão se reunirá novamente? Caso se reúna, a bomba virá mais forte? E, sobretudo, será possível uma Corte constitucional retornar um dia a suas funções, depois de se sentir legitimada a agir como uma tropa de choque que solta cachorros e bombas na multidão? Sabemos a resposta e, por isso mesmo, tememos o futuro, que, infelizmente, não será bom.
Andre Marsiglia é advogado constitucionalista especialista em liberdade de expressão. Professor de Direito Constitucional e doutorando pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Especialista do Instituto Millenium